Ecologia de serpentes brasileiras, identificação, prevenção e cuidados de acidentes ofídicos

Características gerais:

As serpentes são répteis de corpo cilíndrico alongado; possuem escamas; grande número de ossos (espinhas), mais de 400 vértebras; não possuem membros; os órgãos internos são alongados, sendo que o pulmão esquerdo é atrofiado ou ausente; são ectotérmicos, necessitam de uma fonte externa de calor( a preferência térmica desses animais podem variar de acordo com, a condição reprodutiva, se está ou não em troca de pele, a idade, o sexo e se está alimentada ou não); possuem pálpebras fixas, ou seja, não piscam os olhos, dormem com eles aberto; a mandíbula é separada, o que facilita comer grandes presas; possuem ampla diversidade geográfica, exceto nos polos; as serpentes peçonhentas inoculam peçonha por meio de presas e são carnívoras.

Realizam trocas de pele (ecdise) ao longo do crescimento, seus hábitos variam de acordo com a espécie, podem ser arborícolas, fossoriais ou terrícolas. Algumas ao descansar fazem o enrodilhamento ou achatam o corpo. São frequentemente encontradas em tocas, cupinzeiros, rochas, serrapilheira e até mesmo na água. São animais solitários, encontrando-se apenas para o acasalamento ou possíveis disputas territoriais de machos.

Podem ser vivíparas, os filhotes são fecundados internamente e quando nascem já saem formados ou ovíparas, quando há a postura de ovos e os filhotes se desenvolvem dentro deste. Na maioria dos casos as serpentes não realizam o cuidado parental; ou seja, a partir do momento em que ela põe os ovos ou parem os filhotes, a mãe os abandona.

Funcionamento dos sentidos das serpentes:

– Visão: visão pouco desenvolvida.

– Olfato: não utilizam a narina para captação de odores; elas usam a língua para captar as partículas de odores, onde as leva para o órgão de Jacobson (órgão localizado na parte superior da cabeça, “céu da boca”, revestido por células quimiossensoras que levam a informação adquirida até o cérebro; traduzindo a informação).

– Audição: é ruim, porém percebem as vibrações do solo através da columela (osso que fica encostado na mandíbula) e traduz as vibrações.

Além disso, possuem fosseta labial(estrutura receptora presente nos “lábios” da serpente)  ou/e fosseta Loreal ( orifício entre a narina e os olhos) , que é um termo receptor cheio de inervações que percebe as variações de temperatura, é como se fosse uma câmera de infravermelho.

Fosseta loreal  :                                  


   Fonte de imagem:cobrasvenenosas

Fosseta labial:

  Fonte de imagem: NPAbombeiros.

Dentição de serpentes:

– Áglifas: são serpentes que não possuem dente inoculador de peçonha.

– Opistóglifas: a peçonha, fica na parte de trás dos dentes e quando pressionada a glândula de duvernoy, o veneno escorre a até o local onde foi picado; havendo um envenenamento superficial e em menor quantidade.

As cobras peçonhentas, que causam a maior parte dos acidentes ofídicos, possuem os seguintes padrões de dentes:

– Proteróglifas: Possuem resquícios de ranhura no dente a frente.

– Solenóglifa: possui dentes móveis na parte da frente que possuem um canal, no meio do dente, que inocula o veneno durante a picada.

Fonte de imagem: edisciplinas.

Peconha ou Veneno?

É muito comum haver uma confusão entre os dois termos, apesar de serem utilizados por muitos como sinônimos, existe uma pequena diferença entre os dois termos:

– Veneno: é qualquer substância que quando inalado, ingerido ou absorvido, causam algum dano ao organismo.

– Peçonha: substância tóxica produzida por uma glândula animal especializada, inoculada no tecido por algum aparato especializado.

Serpentes peçonhentas do Brasil:

Do grupo monofilético dos Reptilia, as serpentes estão em uma linhagem denominada lepidossaura, que abrange, serpentes, lagartos e anfisbenas, na ordem dos squamatas. No Brasil, apenas duas famílias, a Vipiridae e a Elapidae, são consideradas de importância médica. Dentro dessas famílias, vou abordar os quatro principais Gêneros:

– Bothrops (Jararacas): está presente em todos os biomas brasileiros, possui 28 espécies diferentes. Sua dentição é solenóglifa; tem fosseta loreal; possui escamas quilhadas, como se fosse um telhado; a cauda é uniforme; possui pupila vertical (igual de gato) e apesar da mudança de coloração de acordo com a posição geográfica, os padrões de manchas não mudam.

Fonte de imagem: infoescola

-Crotalus ( Cascavéis): estão presentes em todos os biomas brasileiros; possui apenas uma espécie com cinco subespécies. Sua dentição é solenóglifa; possui fosseta loreal; escama quilhada e a presença de um guizo/ chocalho ( que é resquícios da troca de pele, onde cada divisória significa uma troca de pele) na cauda. O padrão de coloração muda, mas o desenho padrão de losango é único do gênero.

Fonte de imagem: segredos dos mundos

– Lachesis (surucucu pico de jaca): é a maior peçonhenta do Brasil, possui apenas uma espécie, com distribuição na Amazônia e na Mata Atlântica. Possui dentição solenóglifa; possui fosseta loreal; sua escama é cônica (como se fosse a casca da jaca) e a cauda possui escamas eriçadas.

Fonte de imagem: pinterest

– Micrurus(corais verdadeiras): são criaturas muito venenosas e nunca devem ser manuseadas por qualquer um sem propósito de extrema importância. A dentição é proteróglifa; não possuem fosseta loreal; os padrões de cores variam entre branco, amarelo, preto e vermelho; existe um padrão de cores juntas que varia de três em três ou dois em dois; seus anéis completam o corpo dando uma volta inteira; os olhos são pequenos, negros e sem pupila visível e cauda relativamente curto (Obs.: a cauda é medida da cloaca até a ponta).

Fonte de imagem: pinterest

Prevenção de acidentes ofídicos:

Sempre antes de adentrar matas e florestas, certifique-se que na região o hospital mais próximo oferece soro antiofídico para as espécies de serpentes existentes na região.

Sempre utilizar botas e perneiras, caso for manusear esses animais utilizar luvas de raspa, não andar fora de trilhas, caso não precise não entrar em matas e florestas durante a noite e por fim, prestar muita atenção onde pisa.

Primeiros socorros:

-Manter a calma, evita que a peçonha se espalhe rapidamente pelo corpo.

– Limpar o local da ferida com água e sabão, caso não seja possível; NÃO lavar com bebidas alcoólicas ou qualquer outra solução milagrosa, você pode agravar o caso com alguma infecção secundária por bactérias ou fungos.

– Beber bastante água, alguns venenos ofídicos acumulam-se nos rins, ao beber água você evita o acúmulo e uma possível insuficiência renal.

-Se possível, manter o membro afetado levemente elevado, evitando o acúmulo de veneno.

-Procurar atendimento médico, sempre, sempre, sempre.

-Tirar fotos do animal.

O que não fazer:

Chupar o ferimento na intenção de retirar o veneno. Primeiro, não funciona, a glândula de veneno de uma cobra injeta veneno por pressão bem maior do que sua sucção. Segundo, caso você tenha algum ferimento na boca( dente problemático, aftas) corre-se o risco se envenenar-se duas vezes.

-Não cortar o ferimento. Não irá adiantar, apenas fará uma ferida externa, “abrindo portas” para outras infecções.

– Não ingerir chás milagrosos, cujo efeito não tem comprovação científica.

-NÃO FAZER TORNIQUETE, o isolamento do veneno no membro por amarração, irá concentrar a quantidade de peçonha levando á um apodrecimento do membro, acarretando a sua amputação.

Complicações dos acidentes, toxinas ativas e soros existentes:

– Acidente botrópico: As complicações leve, há um sangramento discreto em peles ou mucosas, havendo um distúrbio na coagulação. Complicações moderadas: ocorre a formação de edema, sangramento leve e distúrbios na coagulação. Complicações graves: alterações locais intensas, hemorragia grave, choque de insuficiência renal.

Tratamento: Soro antibotrópico(penta valente); Soro antibotrópico(penta valente) combinado com antilaquético ou Soro antibotrópico combinado com soro anticrotálico.

– Acidente laquético: Complicações moderadas, quadro local presente, pode haver sangramentos sem manifestações neurológicas. Complicações grave, quadro local intenso, hemorragia intensa com manifestações neurológicas.

Tratamento: Soro antibotrópico (penta valente) combinado com antilaquético.

– Acidente Crotálico: complicações leves, neuroparalíticas discretas, sem dor muscular intensa e escurecimento da urina. Complicações moderadas, alteração neuroparalíticas evidentes, dor muscular intensa e urina escura. Complicações graves, alterações neuroparalíticas evidentes, dor muscular intensa e escurecimento da urina.

Tratamento: Soro antibotrópico combinado com soro anticrotálico ou soro antibotrópico ( pentavalente) combinado com o soro anticrotálico.

-Acidente Elapídico: alto risco de insuficiência respiratória.

Tratamento: Soro antilapídico (bivalente).

Um dos maiores problemas enfrentados para o tratamento de acidentes ofídicos no Brasil, são as crendices. E é só por meio da educação ambiental é que se pode mudar essa realidade.

Referências:

BERNARDE, Paulo Sérgio. Acidentes ofídicos. Laboratório de Herpetologia – Centro Multidisciplinar – Campus Floresta Universidade Federal do Acre – UFAC, 2009.

BERNARDE, Paulo Sérgio. Serpentes peçonhentas: acidentes ofídicos no Brasil. São Paulo: Anolisbooks, 2014.

Deixe um comentário